Congresso terá de debater temas sensíveis, por meio de legislações adicionais, como normas para regimes específicos de tributação e a composição da cesta básica.
Após mais de 30 anos de impasse e muitas concessões, a reforma tributária caminha para a reta final no Congresso. Com a aprovação no Senado, resta uma segunda análise pela Câmara, com possibilidade de promulgação fatiada dos trechos comuns às duas Casas. Mas a discussão ainda está longe do fim. Isso porque o governo empurrou uma série de definições para as leis complementares, que devem ser analisadas a partir de 2024.
Entre as pendências estão o valor de parte dos fundos que serão abastecidos pela União e direcionados aos Estados; a composição da cesta básica isenta; as regras do Imposto Seletivo; o funcionamento dos diversos regimes específicos de tributação e a operacionalização do cashback, o sistema de devolução de tributos. Ou seja, uma nova guerra de lobbies já está contratada.
“A PEC dispõe apenas sobre as normas gerais e empurra o restante para a lei complementar”, afirma o tributarista Gustavo Brigagão, sócio do Brigagão Duque Estrada Advogados. Para evitar insegurança jurídica, o tributarista defende que as regulamentações sejam feitas o mais rapidamente possível. “Mas não sei se o Congresso terá energia e disciplina.”
ALÍQUOTA-PADRÃO
A regulamentação dos regimes específicos é um tema aguardado, pois vai calibrar o tamanho da alíquota de referência. Apesar das estimativas divulgadas pelo Ministério da Fazenda, que já colocam o Brasil no topo do ranking mundial, só será possível definir o porcentual exato após o estabelecimento das regras.
É nessa regulamentação que serão definidos, por exemplo, quais produtos, tipos de serviços ou empresas terão direito a tratamento tributário diferenciado. Se o leque das exceções for muito flexibilizado, a alíquota do novo Imposto sobre Valor Agregado (IVA) vai subir ainda mais. E quem vai pagar a conta são os contribuintes que consomem produtos que não estão nessa lista de excepcionalidades.
Percy Soares, diretor executivo da Abcon, associação que reúne as empresas privadas de concessão de saneamento, avalia que a briga será maior entre os grandes setores que foram parar no regime específico, como transporte, telecomunicações, rodovias e saneamento.
Para ele, será necessário discutir a importância de cada segmento. “O que é mais importante: o transporte de minério ou o saneamento preventivo contra doenças?”, diz Percy ao defender o seu setor.
O segmento de telecomunicações também já está em contato com os parlamentares. “A gente não vive sem água, luz, esgoto e internet”, afirma Vivien Mello Suruagy, presidente da Federação Nacional de Call Center, Instalação e Manutenção de Infraestrutura de Redes de Telecomunicações e de Informática (Feninfra).
Manoel Pires, coordenador do Observatório Fiscal do IBRE/FGV, avalia que há exceções muito mal definidas, com a possibilidade de setores inteiros poderem ter o tratamento diferenciado. “Se liberarem muito na regulamentação, a alíquota vai lá para cima”, disse.
À Rádio Eldorado, o secretário extraordinário de Reforma Tributária, Bernard Appy, reforçou que a alíquota-padrão, que será adotada para quem não tiver tratamento diferenciado, só será definida após essa regulamentação. “Vai depender de quanto será arrecadado de Imposto Seletivo, quantos serão os regimes específicos e quais bens e serviços estarão na cesta básica nacional.”
FONTE: O Estado de S. Paulo