Segundo dados do Instituto Locomotiva, há 17,1 milhões de pessoas vivendo em favelas; 7,8% das moradias estão nessas comunidades. Metade dos brasileiros vive com uma renda familiar menor que R$ 2.400. A chamada baixa renda concentra 173 milhões de pessoas.

Convidado para o 8º ENA, o presidente do Instituto, Renato Meirelles, apresentou esses e outros números no evento para mostrar o Brasil que muitas vezes escapa das estatísticas oficiais. Muitas dessas pessoas passarão a ser atendidas pela primeira vez com o serviço de água potável e esgotamento sanitário, exigindo das operadoras privadas um olhar diferenciado sobre essa população.

Confira mais na entrevista com Renato:

O Brasil possui cerca de 100 milhões de brasileiros sem coleta e tratamento de esgoto. Como as empresas de saneamento devem lidar com essa população que passará a ter acesso a esse serviço?

Renato: Nós temos estudado o perfil desse consumidor brasileiro de baixa renda sob a ótica da demanda. Mas o importante é lembrar, no dia a dia, que os números coletados são apenas estatísticas. Atrás de cada número tem a história de uma pessoa. É preciso lembrar da criança que passa por um córrego antes de ir para escola, do pai ou da mãe de família que fica na dúvida se permanece naquela comunidade ou se busca um lugar melhor para se viver. Toda vez que alguém abrir uma planilha, deve atentar para essas vidas.

Qual é a realidade desse consumidor?

Renato: Vamos pensar num recorte importante, que são as favelas, ou o que o IBGE chama de aglomerado subnormal. No Brasil, elas equivalem a um território maior do que muitos países. Há mais favelados do que gaúchos ou baianos, por exemplo. Essas pessoas estão distribuídas em 13 mil favelas e 5 milhões de famílias. Cerca de 46% dos lares em favelas não têm água encanada. É a casa de pessoas que estão mais sujeitas a doenças, uma vez que carecem de anticorpos sociais, muitos deles garantidos pelo saneamento básico. A saúde preventiva começa com o saneamento básico.

Com relação à renda, quais são os números do Instituto a respeito dessa população?

Renato: Se considerarmos que o Brasil possui mais de 70 milhões de famílias, metade delas está vivendo com menos de R$ 2.400. Só 10% está na faixa de renda acima de R$ 8.100. Temos, sem dúvida, um país desigual. E a desigualdade no Brasil tem rosto. Mais da metade da população de baixa renda tem até 34 anos; e 56% não concluiu o ensino médio. Apenas 9% desse pessoal concluiu a faculdade. 43% dos lares das classes C, D e E são chefiados por mulheres. Nas favelas, este número chega a 56%. Ao todo, 82% da população pertence à baixa renda. E em números absolutos, o Sudeste concentra 38% dessas pessoas. Isso significa dizer que o desafio do saneamento não está concentrado em regiões mais distantes. Há muito ainda a se avançar nas regiões metropolitanas.

Do ponto de vista da comunicação, como atingir essas pessoas?

Renato: A conta de água tem um impacto diferente em cada família. As estratégias de comunicação precisam considerar a realidade que descrevi com números. O desafio é lidar com famílias que são diferentes. O que se pode afirmar é que, do ponto de vista de quem recebe os serviços, proporcionar melhores condições e uma vida saudável para a família é uma preocupação comum. Para as comunidades de baixa renda, ter saneamento significa um salto em saúde e qualidade de vida, considerando que hoje muitos não conseguem nem mesmo tomar banho em casa após um dia de trabalho. Isso precisa ser muito nítido para quem atua no saneamento e também para o poder público. A moeda que o poder público entende é o voto. O saneamento pode não ser um assunto de destaque em eleições, mas se você expõe o problema que a falta dele acarreta, ele ganha relevância para consumidores e clientes, e passa a ter relevância como política pública. E só será resolvido quando for encarado como prioridade de política pública. Essa é a lógica dos fatos.