O saneamento básico, assim como a saúde, deve ser reconhecido como um direito fundamental. O acesso à água potável, coleta e tratamento de esgoto são essenciais para garantir a dignidade e a qualidade de vida da população.
No entanto, a atual proposta de reforma tributária, se aprovada como está, pode comprometer os avanços alcançados desde o novo Marco Legal do Saneamento (Lei 14.026/2020), sancionado há quatro anos pelo mesmo Congresso.
A reforma prevê um aumento significativo na carga tributária para o setor de saneamento, passando de 9,74% para 26,5%. Uma das consequências é onerar imediatamente os prestadores de serviços, reduzindo drasticamente sua capacidade de investimento, caso não haja reequilíbrio prévio dos contratos. Com isso, o Brasil corre o risco de se afastar ainda mais da meta de universalização do saneamento básico até 2033, estabelecida pela legislação atual.
E não é só. A unificação dos tributos proposta pela reforma também poderá elevar as tarifas em até 18% para os todos os consumidores. Mesmo os beneficiários da tarifa social, que têm direito ao cashback, enfrentarão um aumento de 6,5%. Isso significa que os mais vulneráveis, que já enfrentam dificuldades para ter acesso a serviços básicos, serão os mais prejudicados. Ou seja, todo mundo perde, especialmente aqueles que mais precisam.
A proposta escolhe fechar os olhos para o abismo de um país em que mais da metade da população brasileira não possui rede nem coleta e tratamento de esgoto e cerca de 15% não têm acesso à água potável, e ainda deixa de considerar a relação que o saneamento básico tem com a saúde.
A falta de saneamento adequado é diretamente responsável por uma série de doenças, como diarreia, cólera, hepatite A, e esquistossomose, que resultaram em cerca de 1 milhão de internações e 200 mil mortes nos últimos três anos. Cidades com melhores índices de saneamento, como por exemplo São José do Rio Preto, Santos, Uberlândia, Niterói, Limeira e Piracicaba, registram 2,1 internações por 10 mil habitantes, em comparação com 5,2 internações em cidades com piores condições.
Esses números refletem a importância de investir em saneamento como uma medida preventiva de saúde pública, reduzindo custos hospitalares e melhorando a qualidade de vida da população.
Associações como a ABES, ABCON, AESBE e outras entidades do setor estão mobilizadas para garantir que o saneamento básico seja tratado de forma diferenciada na regulamentação tributária, assim como a saúde. Para essas entidades, é imprescindível que haja equivalência do setor de saneamento ao setor de saúde, com redução de 60% do novo IVA, restaurando a lógica da neutralidade tributária, de modo a não comprometer os investimentos necessários para a universalização dos serviços.
O Brasil não pode continuar tratando o saneamento básico como um privilégio de poucos. O saneamento é saúde, é dignidade, e um direito fundamental que precisa de proteção e investimento. O caminho para um país mais justo e saudável passa pela universalização do saneamento, e a reforma tributária deve considerar esse objetivo como prioridade. A sociedade e as instituições devem unir forças para que o Brasil avance e não retroceda nas conquistas essenciais que melhoram a vida de todos.