A nova onda de negócios no setor de saneamento tem acirrado a disputa entre as gestoras de recursos

A nova onda de concessões de empresas de saneamento tem acirrado a disputa entre as gestoras de recursos e movimentado o mercado de capitais. Estruturar fundos com ativos de companhias que oferecem prêmios acima da média das debêntures de infraestrutura e com um ‘selo verde’, lastreado em compromissos socioambientais e com práticas de governança (ESG, na sigla em inglês), desperta também o interesse do investidor.

O desafio é entender o perfil de empresas que têm determinadas características para as quais os especialistas não olhavam com apetite. Mas agora o jogo mudou. Estudo feito pela KPMG em parceria com a Abcon (associação do setor) mostra que as novas concessões exigirão investimentos de R$ 700 bilhões até 2033. E no cálculo das assets, 30% desse total serão financiados via participação acionária (equity) e 70% por meio de emissão de títulos de dívidas e de bancos de fomento.

A Iguá foi a primeira empresa de saneamento a conquistar uma certificação verde, em fevereiro deste ano, para uma emissão de debêntures de infraestrutura de R$ 880 milhões destinados a projetos em Cuiabá (MT) e Paranaguá (PR). As gestoras veem esse movimento como uma tendência, até por exigência dos contratos de concessão que essas empresas assinaram, e correm para captar recursos e montar times especializados no setor.

A Perfin captou R$ 670 milhões em um fundo de investimentos e participação em infraestrutura, o FIP-IE Discovery, que irá investir em novos projetos no setor. No radar estão as vencedoras das últimas concessões de saneamento e as que vencerão os próximos leilões. “Temos o capital comprometido, mas não alocado. Estamos identificando os ativos. Os projetos estruturados pelo BNDES mostraram qualidade. A Cagece, no Ceará, vai fazer uma parceria público-privada que demandará R$ 7 bilhões em investimentos”, observa Gustavo Guimarães, sócio e responsável pela área saneamento da Perfin, listando também a Paraíba e a concessão de Porto Alegre.

A gestora tem área específica para este setor desde 2020 e Guimarães, que já foi CEO da Iguá e CFO da Sanepar, entrou para liderar a equipe em 2021. O novo fundo será composto só por papéis de saneamento com selo ESG. A meta será pagar prêmios acima dos pagos pelos ativos de energia. “Normalmente quando se faz emissão de um fundo em saneamento os prêmios costumam ser IPCA + 7%, acima da NTN-B. Em energia costuma ser IPCA + 1%”, diz Guimarães.

Na Mauá Capital não foi diferente. A gestora tem uma área voltada exclusivamente para infraestrutura, com enfoque em iniciativas ESG para saneamento. A líder da área é a sócia Karla Bertocco, ex-presidente da Sabesp. A visão da casa é que há
uma grande quantidade de projetos surgindo ainda carentes de financiamento apropriado. “O grosso das emissões de saneamento hoje são naturalmente ESG e visam diminuir a perda de água e aumentar o atendimento de esgoto. O capes estimado para os novos contratos de concessão está grandemente relacionado aos objetivos ESG”, diz Bertocco.

A executiva se refere à Lei 14.026, de julho de 2020, que estabelece o novo marco regulatório do saneamento. Na Mauá, os contratos e investimentos financiados preveem metas específicas de redução de perdas de água. E fazem isso de duas formas. Primeiro, mapeiam quanto há de perda de água por região e a meta que a empresa pretende atingir. A segunda é levando os conceitos ESG para indicadores mais práticos.

“A gente têm os dois primeiros contratos de R$ 20 milhões em Interlagos, em São Paulo, com empresas que fazem parte da cadeia de prestadoras de serviços das companhias de saneamento. Nas empresas médias conseguimos ajudar com o G do ESG”, conta Bertocco, que desenvolveu um manual de boas práticas de governança para essas companhias.

Já a JGP estruturou um fundo de crédito ESG, que está em processo de captação. Hoje possui R$ 63 milhões, e sua maior exposição, 23%, é em empresas como a Sabesp, Iguá, Attend Ambiental e a SPE Saneamento Rio 1, da Aegea. O fundo tem pouco mais de um ano e quer chegar a R$ 500 milhões. “Neste fundo tem renda fixa local, as debêntures verdes, green bonds e também best in class, um grupo de empresas em saneamento com as melhores notas e bonds atrelados a metas de sustentabilidade”, afirma Alexandre Muller, sócio e gestor dos fundos de crédito da JGP.

Fonte: Valor Econômico.